Trabalhadora deve ser indenizada por atrasos nos salários e não pagamento das verbas rescisórias
PROCESSO: 0000355-69.2015.5.10.0005
RECLAMANTE: G. T. M. D. A.
RECLAMADO: VESTCON EDITORA LTDA (EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL), E. F. P. e N. S. P. P.
SENTENÇA
RELATÓRIO
G. T. M. D. A. ajuizou Reclamatória Trabalhista contra VESTCON EDITORA LTDA, E. F. P. e N. S. P. P., todos qualificados na inicial, alegando que prestou serviços às reclamadas como assistente de produção, gestora temporária e gestora de NRA no período de 24.11.08 a 28.11.14, não tendo recebido corretamente seus direitos trabalhistas. Afirma que as reclamadas compõe o mesmo grupo econômico. Pleiteia o pagamento das parcelas discriminadas na inicial. Juntou documentos e atribuiu à causa o valor de R$200.000,00.
A primeira reclamada apresentou defesa escrita com documentos, pedindo a suspensão do processo e arguindo preliminar de ilegitimidade passiva. Juntou documentos acerca dos quais a reclamante se manifestou regularmente.
Restou concedida a tutela antecipada para a percepção do FGTS e do seguro-desemprego pela autora, e diante do descumprimento da obrigação pelo empregador, restou cominada a multa respectiva.
Foram realizadas audiências de conciliação e instrução, com produção de provas orais.
Sem outras provas restou encerrada a instrução processual.
Razões finais orais remissivas.
Restaram frustradas as tentativas conciliatórias.
FUNDAMENTAÇÃO
I – SUSPENSÃO
Em primeiro lugar, rejeito o pedido de suspensão do processo, uma vez que já decorreram mais de 180 dias da declaração de recuperação judicial da empresa reclamada, § 4º, da Lei nº. 11.101/05.
II – ILEGITIMIDADE PASSIVA
Nos termos da primeira audiência já restou definido que a única empresa que consta do pólo passivo é a VESTCON LTDA.
Assim, nada a decidir sobre a preliminar de ilegitimidade passiva, já que o processo já restou extinto sem resolução de mérito com relação aos demais reclamados, nos termos da decisão que antecipou os efeitos da tutela.
Retifiquem-se os assentos funcionais.
II – PRESCRIÇÃO
A presente reclamatória foi ajuizada em 12.03.15 e tem como objeto parcelas que retroagem ao período anterior ao quinquídio legal, tornando flagrante a ocorrência da prescrição parcial do direito de ação do autor.
A Constituição Federal dispõe em seu art. 7°:
“Art. 7°: … XXIX – ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato.”
Assim, declara-se a prescrição do direito de ação do reclamante com relação às parcelas anteriores a 12.03.10, desde que exigíveis, de acordo com o princípio da actio nata, extinguindo-se o processo com resolução do mérito com relação a tais parcelas, nos termos do art. 7°, XXIX, da Lex Fundamentalis c/c art. 269, IV do CPC.
III – CONTRATO DE TRABALHO
Restou incontroverso o contrato de trabalho entre as partes no período de 24.11.08 a 15.01.15, nos termos da CTPS cuja cópia foi anexada à inicial.
Diante da ausência de contestação neste aspecto, considero verdadeiro que a reclamante, exercendo a função de assistente de produção, acumulou também serviços inerentes às funções de supervisor temporário (até janeiro/12) e de gestora de NRA (de janeiro/12 ao término do contrato).
Todavia, essa situação, por si só, não gera o direito à percepção de diferenças salariais.
Com efeito, o trabalho desempenhado na mesma jornada de labor, ainda que relativo a tarefas diversas daquelas para as quais o empregado foi contratado, não acarreta o pagamento de nenhum percentual a mais de salário, exceto se houver previsão neste sentido em instrumento coletivo, ou se o empregado estiver desempenhando função mais bem remunerada do que aquela na qual foi registrado. Isso porque o salário remunera o tempo a disposição do empregador, independentemente da função para a qual foi o empregado contratado.
No presente caso, a reclamante não informou na inicial quais eram as atribuições tanto da função para a qual foi contratada como das funções que alega ter acumulado ou exercido, nem informou em qual regulamento ou instrumento coletivo estão previstas as remunerações que citou na peça exordial.
Assim, entendo que não faz jus à percepção de diferenças salariais.
Indefiro, portanto, o pedido de diferenças salariais e reflexos.
Para o cálculo de parcelas a serem, eventualmente, deferidas à reclamante, deverá ser utilizada como base de cálculo a evolução salarial registrada nas folhas de pagamento juntadas aos autos, ressaltando-se que os quinquênios e gratificação integram a remuneração para todos os efeitos.
IV – VERBAS RESCISÓRIAS
Embora a reclamante tenha pedido a rescisão indireta do contrato de trabalho, o aviso prévio que juntou aos autos comprova que foi dispensada sem justa causa em 28.11.14, com projeção do aviso prévio até 15.01.15, conforme registrado em sua CTPS. A reclamada não comprovou o pagamento das verbas rescisórias.
Assim, defiro o pagamento do aviso prévio indenizado (de 28.11.14 a 15.01.15); 13º salário integral de 2014 e proporcional de 2015 na razão de 1/12 (projeção do aviso prévio); um período de férias vencidas na forma simples (2013/2014) e férias proporcionais de 1/12 (projeção do aviso prévio), ambas acrescidas de 1/3; multa do art. 477, § 8º, da CLT e multa de 40% sobre a totalidade do FGTS.
Os depósitos fundiários foram liberados por alvará judicial, incidindo a multa de R$788,00 reais em face da inadimplência da obrigação de fazer pela reclamada, conforme arbitrado na decisão que deferiu a concessão da tutela antecipada.
No prazo de 15 dias após a intimação desta sentença, a reclamante deverá indicar as diferenças de FGTS em seu favor, juntando o extrato fundiário, para possibilitar a liquidação de sentença, sob pena de ser considerado correto o valor depositado no decorrer do pacto laboral.
Quanto ao seguro-desemprego, fica deferido o benefício na forma indenizada, nos valores vigentes à época da rescisão contratual.
Defiro, por fim, o pagamento da multa do art. 467 sobre as verbas rescisórias incontroversas, quais sejam, aviso prévio, saldo de salário, 13º salário e férias com 1/3, na razão de 50% sobre os respectivos valores.
Indefiro o pedido de baixa na CTPS, uma vez que a própria autora juntou aos autos cópia do documento com as respectivas anotações.
V – HORAS EXTRAS E REFLEXOS
A testemunha trazida pela autora comprovou que nem sempre os horários eram registrados corretamente nas folhas de ponto, pois entre um e três dias por semana registravam o horário de saída e voltavam a trabalhar por mais 2 ou três horas, sendo que nessa mesma média não tiravam integralmente o intervalo intrajornada.
Assim, tenho que a reclamante se desincumbiu de seu ônus probatório, logrando elidir a veracidade dos horários registrados nos controles de frequência, ao menos parte deles.
Assim, com base no depoimento da testemunha, reconheço que a reclamante trabalhou uma média de duas horas extras em três dias por semana, restando deferidas na totalidade de seis horas extras por semana, no decorrer de todo o pacto laboral, com adicional de 50%, a serem calculadas com divisor 220.
Defiro também o pagamento de uma hora extra em três dias por semana, com adicional de 50%, a serem calculadas com divisor 220, relativas à ausência de gozo da integralidade do intervalo, sendo o período do intervalo integral nos termos da Súmula nº. 307 do c. Tribunal Superior do Trabalho, e deverá ser pago como sobrejornada nos termos da OJ nº. 355 da SDI 1 do C. TST.
Defiro o pagamento dos reflexos das horas extras deferidas no aviso prévio, férias acrescidas de 1/3, 13º salários e FGTS com multa de 40%, restando indeferido o pagamento de reflexos nos repousos semanais remunerados, uma vez que o reclamante era mensalista, e o cálculo das horas extras é feito sobre o salário mensal.
Ressalte-se que o adicional previsto no art. 71, § 4º, da CLT, tem natureza salarial, nos termos da Súmula nº.354-SBDI-1 do c. Tribunal Superior do Trabalho
VI – DANOS MORAIS
A reclamante pede o pagamento de indenização por danos morais em face da mora contumaz no pagamento dos salários e inadimplemento das verbas rescisórias, afirmando que em face destes problemas teve seu nome negativado junto ao SERASA e não adimpliu a tempo e modo as prestações do imóvel adquirido.
Para que surja a responsabilidade de indenizar, é necessária a verificação de três requisitos, quais sejam, a existência do dano, o nexo causal entre este e a atividade que o empregado exercia na empresa, e a culpa da empregadora, elementos que podem dar ensejo ao pagamento da indenização por danos morais pleiteada na inicial, nos termos dos artigos 286 e 927 do Código Civil Brasileiro.
Quanto à mora contumaz e inadimplemento das verbas rescisórias, por si só, não tem o condão de causar lesão moral ou psicológica, todavia, se o empregado comprovar que essa conduta do empregador lhe causou prejuízos, pode restar configurado o dano moral.
No presente caso, a reclamada não juntou aos autos os contracheques ou recibos ou transferências bancárias que comprovem as datas de pagamento dos salários da reclamante, ônus que lhe incumbia em face do princípio da aptidão para a prova. Assim, considero que efetivamente os salários eram pagos com atraso conforme declinado na inicial. Por outro lado, o documento de fls. 33 comprova que a reclamante passou por dificuldades financeiras no ano de 2014, enquanto vigorava o vínculo empregatício, bem como que seu nome esteve em vias de ser incluído no cadastro de inadimplentes do SERASA.
Embora a dívida que conste do referido documento tenha valor incompatível com os salários da reclamante, obviamente o atraso no pagamento destes concorreu para que a reclamante ficasse inadimplente, aliado ao fato de ter a autora, provavelmente, contraído dívidas além de sua capacidade financeira.
Com base nestes elementos, considero comprovado o dano moral e arbitro a indenização em R$3.984,00, o que equivale a duas vezes a última remuneração, considerando a gravidade do dano e as condições do ofensor e do ofendido.
VII – JUSTIÇA GRATUITA/HONORÁRIOS
Indefiro a concessão dos benefícios da Justiça Gratuita à reclamante, visto que não restaram preenchidos os requisitos previstos no art. 790, § 3º, da CLT.
Indefiro o pagamento de honorários assistenciais, uma vez que não estão presentes os requisitos previstos na Súmula nº. 219 do c. Tribunal Superior do Trabalho.
VIII – JUROS DE MORA/CORREÇÃO MONETÁRIA
Por ocasião da liquidação de sentença, deverá ser observado o seguinte:
a) os juros de mora deverão ser calculados a partir do ajuizamento da ação (art. 883/CLT c/c art. 39, § 1º, da Lei 8.177/91);
b) incide também a correção monetária (art. 39, caput, da Lei 8.177/91), observadas as épocas próprias de vencimento de cada obrigação, e com relação às verbas salariais, deverá ser observado o primeiro dia útil do mês subseqüente ao trabalhado (Súmula 381/TST);
c) aplicam-se os mesmos índices aos recolhimentos de FGTS (Orientação Jurisprudencial 302 da SDI-1/TST);
d) os juros de mora não integram a base de cálculo do imposto de renda, nos termos do art. 404 do Código Civil Brasileiro e da OJ 400 da SDI 1 do C. Tribunal Superior do Trabalho;
e) deverá ser observado o disposto na Súmula n.º 200 do C. Tribunal Superior do Trabalho.
CONCLUSÃO
Diante do exposto, resolve a MM. 5° Vara do Trabalho de Brasília-DF:
a) rejeitar o pedido de suspensão do processo;
b) extinguir o processo com resolução do mérito com relação às parcelas anteriores a 12.03.10, nos termos do art. 7°, XXIX, da Lex Fundamentalis c/c art. 487, II, do CPC;
c) julgar PROCEDENTES EM PARTE os pedidos iniciais e condenar a reclamada VESTCON EDITORA LTDA, solidariamente, a pagar à reclamante G. T. M. D. A., tão logo esta sentença transite em julgado, as parcelas deferidas na fundamentação que integra este decisum, com juros e correção monetária, a serem calculados em regular liquidação de sentença, com observância da Súmula nº. 381 do c. Tribunal Superior do Trabalho.
Confirmo a tutela antecipada já concedida no que se refere à liberação do FGTS.
O cálculo dos recolhimentos previdenciários deverá ser realizado pela contadoria deste Juízo, observando-se a natureza jurídica das parcelas deferidas, nos termos do disposto no art. 28 da Lei nº 8.112/91, com redação alterada pela Lei nº 9.528/97, e do disposto na Lei n. 10.035/00.
A reclamada deverá comprovar nos autos os pagamentos previdenciários e fazendários sobre as parcelas deferidas, sob pena de execução, nos termos do art. 114, § 3º, da Constituição Federal.
Custas processuais no importe de R$200,00, calculadas sobre R$10.000,00, valor arbitrado provisoriamente à condenação, pela reclamada, que deverão proceder ao pagamento no prazo de cinco dias.
A Secretaria deverá desentranhar a petição e documentos de fls. 161/165 e anexá-las ao processo correspondente, tendo em vista o grave equívoco verificado, e os servidores deverão ter maior cautela com a juntada de documentos aos processos.
Intimem-se as partes.
ELISÂNGELA SMOLARECK
Juíza do Trabalho
Fonte: Jornal Jurid
04 de setembro de 2017.
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