Cautelas na contratação de prestadores de serviços terceirizados
Valéria Domingues Borges Vieira[i]
Os juslaboralistas – bem como o a própria Justiça Especializado do Trabalho – sempre se pautaram os fundamentos do regime de terceirização nas regras preconizadas pelo artigo 455 da Consolidação das Leis do Trabalho (subempreitada), artigo 25 da Lei 8.987/95 (regime de concessão e permissão), artigo 94, inciso II, da Lei 9.472/97 (telecomunicações), Lei 7.102/83 (vigilância bancária), Lei 6.019/74 (trabalho temporário), e, com maior razão, no entendimento da Súmula 331 do Colendo Tribunal Superior do Trabalho[ii].
Referida súmula acabava por compreender por lícita a terceirização de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta – condição que determina, por sua vez, a ilicitude da terceirização de serviços ligados à atividade-fim do tomador de serviços.
Para que se compreenda com a oportuna propriedade, atividade-meio não é inerente ao objetivo principal da empresa, trata-se de serviço necessário, mas que não tem relação direta com a atividade principal da empresa, ou seja, é um serviço não essencial; já atividade-fim, por sua vez, é a que caracteriza o escopo principal da empresa, a sua destinação, o seu empreendimento, normalmente expresso no contrato social.
Todavia, a Lei 13.429/2017 e a Lei 13.467/17 (Lei da Reforma Trabalhista) alterou a Consolidação das Leis do Trabalho e as Leis 6.019/1974, 8.036/1990 e 8.212/1991, a fim de adequar a legislação às novas relações de trabalho.
Considerando, pois, o atual critério legal, a terceirização é a transferência feita pela contratante (tomadora) da execução de quaisquer de suas atividades, inclusive sua atividade principal, à pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviços que possua capacidade econômica compatível com a sua execução (art. 4º-A da Lei 6.019/1974, com redação dada pela Lei 13.467/2017).
Admite-se, assim, de forma expressa a terceirização de forma ampla, ou seja, de quaisquer das atividades da contratante (tomadora), inclusive de sua atividade principal. Por conseguinte, resta superada a distinção entre atividades-fim e atividades-meio, anteriormente adotada pela Súmula 331, item III, do Tribunal Superior do Trabalho.
O novo regramento delineia novo perfil da terceirização, destacando-se os seguintes aspectos:
- Terceirização é a transferência feita pela contratante (tomadora) da execução de quaisquer de suas atividades, inclusive sua atividade principal, à pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviços que possua capacidade econômica compatível com a sua execução.
- Intermediação de mão de obra não é admita, por resultar em fraude ao vínculo de emprego com o efetivo empregador (art. 9º da CLT) e em violação ao valor social do trabalho (art. 1º, inciso IV, da Constituição da República), o qual não pode ser tratado como mercadoria (Declaração de Filadélfia, da Organização Internacional do Trabalho, item I, a).
- A terceirização deve envolver a prestação de serviços e não o fornecimento de trabalhadores por meio de empresa interposta. Portanto, entende-se que os referidos serviços, na terceirização, devem ter certa especialidade.
- A empresa prestadora de serviços a terceiros, assim, não pode ser pessoa física, nem empresário individual, devendo ser necessariamente pessoa jurídica.
- A empresa prestadora de serviços contrata, remunera e dirige o trabalho realizado por seus trabalhadores, ou subcontrata outras empresas para realização desses serviços.
- Não se configura vínculo empregatício entre os trabalhadores, ou sócios das empresas prestadoras de serviços, qualquer que seja o seu ramo, e a empresa contratante.
- Os requisitos para o funcionamento da empresa de prestação de serviços a terceiros são previstos no art. 4º-B, incluído pela Lei 13.429/2017[iii].
- Na terceirização, a contratante pode estender ao trabalhador da empresa de prestação de serviços o mesmo atendimento médico, ambulatorial e de refeição destinado aos seus empregados, existente nas dependências da contratante, ou local por ela designado[iv].
- Contratante e contratada podem estabelecer, se assim entenderem, que os empregados da contratada farão jus a salário equivalente ao pago aos empregados da contratante, além de outros direitos não previstos no art. 4º-C da Lei 6.019/1974.
- Nos contratos que impliquem mobilização de empregados da contratada (prestadora) em número igual ou superior a 20% dos empregados da contratante (tomadora), esta pode (trata-se de faculdade e não obrigação) disponibilizar aos empregados da contratada os serviços de alimentação e atendimento ambulatorial em outros locais apropriados e com igual padrão de atendimento, com vistas a manter o pleno funcionamento dos serviços
- É vedada à contratante a utilização dos trabalhadores em atividades distintas daquelas que foram objeto do contrato com a empresa prestadora de serviços.
- Os serviços contratados podem ser executados nas instalações físicas da empresa contratante ou em outro local, de comum acordo entre as partes.
- É responsabilidade da contratante garantir as condições de segurança, higiene e salubridade dos trabalhadores, quando o trabalho for realizado em suas dependências ou local previamente convencionado em contrato.
- A empresa contratante (tomadora) é subsidiariamente responsável pelas obrigações trabalhistas referentes ao período em que ocorrer a prestação de serviços, e o recolhimento das contribuições previdenciárias observará o disposto no art. 31 da Lei 8.212/1991.
- Não pode figurar como contratada (prestadora), a pessoa jurídica cujos titulares ou sócios tenham, nos últimos 18 meses, prestado serviços à contratante na qualidade de empregado ou trabalhador sem vínculo empregatício, exceto se os referidos titulares ou sócios forem aposentados (art. 5º-C da Lei 6.019/1974, acrescentado pela Lei 13.467/2017).
- Importante ressaltar, o artigo 5º-D da Lei 6.019/1974, acrescentado pela Lei 13.467/2017, por sua vez, dispõe que o empregado que for demitido não poderá prestar serviços para esta mesma empresa na qualidade de empregado de empresa prestadora de serviços antes do decurso de prazo de 18 meses, contados a partir da demissão do empregado.
Com efeito, certo é que em que pese a espectro da terceirização ter sido ampliado, há regras a serem observadas e, caso a terceirização seja reconhecida como ilícita por caracterizar o mascaramento do vínculo empregatício, certamente tanto a tomadora como a prestadora de serviços responderão – aquela subsidiariamente – pelas obrigações trabalhistas, fundiárias e previdenciárias.
Assim, cabe tanto à tomadora como à prestadora de serviços observar as cautelas trazidas pela própria redação do novo regramento jurídico, sob pena de eventual reconhecimento de vínculo empregatício e condenação ao pagamento de verbas contratuais e indenizatórias, se caso.
Conhecer as regras expostas vai ao encontro do que sempre afirmamos: é melhor prevenir do que indenizar.
[i] Advogada desde 2001 – OAB/SP 182.701 – Sócia de Fernando Borges Vieira Sociedade de Advogados – Bacharel em Direito (FMU) – Pós Graduara em Direito Processual Civil (CPPG/FMU).
[ii] Súmula 331/TST: CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE (nova redação do item IV e inseridos os itens V e VI à redação) – Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011 I – A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (lei 6.019, de 03/01/74). II – A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/88). III – Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (lei 7.102, de 20/06/83) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta. IV – O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial. V – Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da lei 8.666, de 21/06/93, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada. VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.
[iii] Art. 4º-B. São requisitos para o funcionamento da empresa de prestação de serviços a terceiros: I – prova de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ); II – registro na Junta Comercial; III – capital social compatível com o número de empregados, observando-se os seguintes parâmetros: a) empresas com até dez empregados – capital mínimo de R$ 10.000,00 (dez mil reais); b) empresas com mais de dez e até vinte empregados – capital mínimo de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais); c) empresas com mais de vinte e até cinquenta empregados – capital mínimo de R$ 45.000,00 (quarenta e cinco mil reais); d) empresas com mais de cinquenta e até cem empregados – capital mínimo de R$ 100.000,00 (cem mil reais); e e) empresas com mais de cem empregados – capital mínimo de R$ 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil reais)”.
[iv] Essa previsão tem caráter meramente facultativo, diversamente da mencionada determinação cogente relativa ao trabalho temporário (art. 9º, § 2º, da Lei 6.019/1974). Entretanto, de acordo com o art. 4º-C da Lei 6.019/1974, acrescentado pela Lei 13.467/2017, são asseguradas aos empregados da empresa prestadora de serviços a que se refere o art. 4º-A da Lei 6.019/1974, quando e enquanto os serviços, que podem ser de qualquer uma das atividades da contratante, forem executados nas dependências da tomadora, as mesmas condições: I – relativas a: alimentação garantida aos empregados da contratante, quando oferecida em refeitórios; direito de utilizar os serviços de transporte; atendimento médico ou ambulatorial existente nas dependências da contratante ou local por ela designado; treinamento adequado, fornecido pela contratada, quando a atividade o exigir; II – sanitárias, de medidas de proteção à saúde e de segurança no trabalho e de instalações adequadas à prestação do serviço.
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