
A ilegalidade de cobrança da taxa de conveniência na aquisição de ingressos
Renata Cristina Marques Ferreira[i]
Nos dias atuais tornou-se comum frequentadores de casas de shows, cinemas e teatros adquirirem ingressos pela internet, haja vista a comodidade proporcionada.
O conforto, porém, acaba por refletir no valor final do ingresso, pois na aquisição deste tipo de produto o consumidor é obrigado a pagar a chamada “Taxa de Conveniência”, adicional que representa aproximadamente 15% (quinze por cento) do valor do ingresso.
As empresas alegam que para garantir a comodidade do consumidor é necessário que haja um investimento em estrutura e segurança, além da constante atualização dos serviços de venda e distribuição de ingressos, fator gerador de custos.
O consumidor, mesmo pagando referida taxa, na grande maioria das vezes, acaba tendo que se deslocar até o ponto de venda para adquiri-lo, pagar pelo envio do ingresso para sua residência, ou mesmo imprimi-lo.
A venda de ingressos pela internet é parte essencial do negócio, um risco da atividade comercial e integrante do investimento do fornecedor, compondo, assim, o custo básico embutido no preço.
A cobrança da chamada “Taxa de Conveniência” caracteriza-se como transferência interna de custos da empresa para o consumidor, impondo a este uma onerosidade excessiva, visto que dele é cobrado por fazer uso de um recurso que já é inerente ao serviço prestado pelas empresas.
No dia doze de março de 2019, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu, por maioria de votos, ser ilegal a cobrança de taxa de conveniência na venda de ingressos de shows e eventos pela internet. A Turma decidiu, ainda, que as empresas deverão devolver taxas de conveniência cobradas nos últimos cinco anos. A decisão é válida em todo o território nacional, mas ainda cabe recurso à própria Turma e ao Supremo Tribunal Federal, caso haja questão constitucional a ser discutida.
O Superior Tribunal de Justiça analisou pedido da Associação de Defesa dos Consumidores do Rio Grande do Sul, em face da empresa Ingresso Rápido.
A entidade ajuizou ação coletiva em face da referida empresa, sustentando ser prática abusiva o fato de o consumidor, além de ser compelido a pagar uma taxa de conveniência elevada quando da aquisição de ingressos on-line, ainda ter de se deslocar até o ponto de entrega dos ingressos e enfrentar filas no dia do evento para que possa ter sua compra validada.
O Juízo da 16ª Vara Cível de Porto Alegre julgou a ação procedente e determinou que a empresa se abstivesse de efetuar a cobrança de taxa de conveniência, sob pena de multa cominatória. A empresa Ingresso Rápido recorreu e em 2016 o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul considerou legal a referida cobrança por entender que a venda de ingressos pela internet não é o único meio de aquisição e sim uma mera opção colocada à disposição dos consumidores.
A Associação de Defesa dos Consumidores recorreu ao Superior Tribunal de Justiça que, por maioria de votos, deu parcial provimento ao recurso interposto contra a decisão do Tribunal de Justiça gaúcho.
Relatora do caso, a Ministra Nancy Andrighi entendeu que a venda de ingressos on-line é parte do risco da atividade comercial e que a modalidade beneficia as empresas. Segundo seu entendimento a venda pela internet, que alcança interessados em número infinitamente superior que a venda por meio presencial, privilegia os interesses dos produtores e promotores do espetáculo cultural de terem, no menor prazo possível, vendidos os espaços destinados ao público e realizado o retorno dos investimentos.
A plataforma de ingressos pela internet é uma intermediária entre a organizadora do evento e o consumidor. Sendo assim, a empresa contratante deve ser responsável por arcar com a remuneração dos sites de ingressos, não os consumidores.
O custo de terceirizar a venda dos ingressos não pode ser transferido para o consumidor através da Taxa de Conveniência, pois caracteriza “venda casada”. A “venda casada” fere o princípio da boa-fé objetiva, pois atinge a liberdade de escolha do cliente decorrente da vinculação da aquisição de um produto/serviço à aquisição de outro, quando o intuito do consumidor é de adquirir apenas o produto/serviço principal.
Relevante salientar que a Ministra considerou que a ilegalidade da cobrança da “Taxa de Conveniência” é insuficiente para caracterizar o dano moral, visto não atingir valores essenciais e tampouco possuir o atributo da intolerabilidade. Configura-se apenas a mera infringência à lei ou ao contrato, decorrente da transferência indevida de encargos do fornecedor para o consumidor.
A Ministra, por fim, destacou que a eficácia e os efeitos da sentença proferida nos autos da ação coletiva estão circunscritos aos limites objetivos e subjetivos do que foi decidido, levando-se em conta a extensão do dano e a qualidade dos interesses metaindividuais, tendo a sentença, portanto, validade em todo o território nacional.
[i] Advogada desde 2005 – OAB/SP 235.138 – Advogada responsável pela unidade de Santos e litoral.
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