[Artigo] Empregado Absolvido Na Esfera Criminal Não Reverte Justa Causa na Justiça do Trabalho
Fernando Borges Viera[i]
RECURSO ORDINÁRIO EM AÇÃO RESCISÓRIA SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 5.869/73 – JUSTA CAUSA – PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR – ABSOLVIÇÃO NA ESFERA CRIMINAL – FALSIDADE DA PROVA – ERRO DE FATO. 1. EMBORA O AUTOR NÃO TENHA CAPITULADO A PRETENSÃO RESCISÓRIA NOS INCISOS VI E IX DO ART. 485 DO CPC/73, CONSOANTE O TEOR DA PRIMEIRA PARTE DA SÚMULA Nº 408 DESTA CORTE, É POSSÍVEL A ANÁLISE DA PRETENSÃO SOB ESTES ENFOQUES DESDE QUE A NARRATIVA DOS FATOS LANÇADOS EM SUA INICIAL PERMITA INFERIR OS FUNDAMENTOS DE RESCINDIBILIDADE PREVISTOS NOS MENCIONADO INCISOS. 2. DE ACORDO COM O ART. 485, INCISO IX E SEUS PARÁGRAFOS, DO CPC/73, A CONFIGURAÇÃO DO ERRO DE FATO DECORRE DA CONSTATAÇÃO DE ELE TER SIDO A CAUSA DETERMINANTE DA DECISÃO QUE ADMITIRA UM FATO QUE INEXISTIU OU CONSIDERARA INEXISTENTE UM FATO QUE SE VERIFICOU, SENDO IMPRESCINDÍVEL QUE SOBRE TAL FATO NÃO TENHA HAVIDO CONTROVÉRSIA OU PRONUNCIAMENTO JUDICIAL. 3. NÃO ENSEJA O CORTE RESCISÓRIO A INTERPRETAÇÃO DADA PELO JUIZ AO ACERVO PROBATÓRIO E AO CONTEXTO FÁTICO, AINDA QUE ENTENDA A PARTE PELA INCORREÇÃO OU ILEGALIDADE DA DECISÃO, POIS A AÇÃO RESCISÓRIA NÃO SE DESTINA A CORRIGIR SUPOSTAS INJUSTIÇAS COMETIDAS PELO JULGADOR. INCIDE O ÓBICE NA ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL Nº 136 DA SBDI-2 DESTA CORTE. 4. NÃO HÁ NENHUM ELEMENTO NOS AUTOS QUE DEMONSTRE A FALSIDADE DO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR INSTAURADO, NEM MESMO A FALSIDADE DOS DEPOIMENTOS ALI COLHIDOS. O EQUÍVOCO NA INTERPRETAÇÃO DESSES DEPOIMENTOS E DOS FATOS APURADOS NÃO IMPLICA A SUA FALSIDADE. 5. OUTROSSIM, A SENTENÇA QUE ABSOLVEU O AUTOR, PROFERIDA NA ESFERA CRIMINAL, NÃO TRATOU DAS MESMAS QUESTÕES APRECIADAS NA ESFERA TRABALHISTA, QUE CONFIRMOU A EXISTÊNCIA DE INFRAÇÃO AO DEVER DE ZELO DO EMPREGADO, POR CULPA, CONCORRENDO INDIRETAMENTE PARA QUE SE CONSOLIDASSEM DANOS AO PATRIMÔNIO PÚBLICO, CONDUTA ESSA QUE JUSTIFICOU A MANUTENÇÃO DA RUPTURA POR JUSTA CAUSA, EMBORA NÃO SE TIPIFIQUE COMO CRIME. 6. ASSIM, TAMBÉM SOB ESSE ASPECTO NÃO HÁ INDÍCIOS DE FALSIDADE DO PROCESSO DISCIPLINAR INSTAURADO OU DOS DEPOIMENTOS ALI COLHIDOS. RECURSO ORDINÁRIO CONHECIDO E DESPROVIDO. (PROCESSO Nº TST-RO-20659-43.2013.5.04.0000 – SESBDI-2 – MINISTRO RELATOR VIEIRA DE MELLO FILHO).
A Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2) do Tribunal Superior do Trabalho manteve a improcedência de ação rescisória movida por um ex-funcionário da Companhia Riograndense de Saneamento (CORSAN) visando desconstituir decisão já transitada em julgado que manteve sua dispensa por justa causa por omissão em fraude na empresa.
Absolvido na esfera criminal, ele alegava que o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) teria decidido sobre o mesmo fato de forma diversa do juízo criminal, mas os julgadores entenderam que a sentença proferida na esfera criminal não tratou das mesmas questões apreciadas na esfera trabalhista e, por isso, rejeitaram a pretensão.
Ex-chefe do Departamento Financeiro da Superintendência Regional dos Sinos (SURSIN), em Tramandaí (RS), o funcionário foi, juntamente com cinco colegas, alvo de sindicância interna para apurar irregularidades na empresa. Segundo o processo, a comissão sugeriu apenas a aplicação de pena de suspensão ao empregado, mas a assessoria jurídica opinou pela extinção do contrato de todos os envolvidos.
Durante a investigação, o funcionário informou que todos os documentos comprovavam que ele apenas obedeceu às ordens de seus superiores, e que não era de sua competência a contratação de serviços, execução ou mesmo fiscalização de obras, fatos esses que deram origem às irregularidades constatadas pela sindicância. O TRT-RS, no entanto, concluiu que, embora em um primeiro momento tenha se negado a tomar parte na fraude, ele cedeu à pressão dos superiores, descumprindo o dever funcional de denunciar as irregularidades.
Na ação originária, a Justiça do Trabalho da 4ª Região (RS) manteve a justa causa por falta grave (ato de improbidade administrativa e infração ao estatuto disciplinar da Corsan). Depois da absolvição pela Justiça Comum em processo criminal, o ex-empregado ajuizou ação rescisória com o argumento de que a decisão trabalhista violou o artigo 935 do Código Civil, segundo o qual não se pode mais questionar a existência de fato quando as questões se acharem decididas no juízo criminal.
Como a ação foi julgada improcedente, ele recorreu ao TST, sustentando que a jurisprudência é pacífica no sentido de vincular as esferas criminal, civil e trabalhista em certas hipóteses, como no caso de absolvição criminal por inexistência material do fato ou por negativa de autoria. Alegou também que a decisão se fundou em prova falsa (artigo 485, inciso VI, do Código de Processo Civil de 1973) e continha erro de fato (inciso IX do mesmo dispositivo). Para o empregado, haveria no processo elemento capaz, por si só, de modificar o resultado do julgamento e que foi desconsiderado.
O relator do recurso, ministro Vieira de Mello Filho, explicou que a configuração do erro de fato decorre da constatação de ele ter sido a causa determinante da decisão, que teria admitido um fato que não existiu ou considerado inexistente um fato que ocorreu, sendo imprescindível que sobre ele não tenha havido controvérsia ou pronunciamento judicial.
Em relação à falsidade da prova, o ministro afirmou que não há nenhum elemento nos autos que demonstre a falsidade do processo administrativo disciplinar instaurado ou dos depoimentos colhidos na sindicância. “O equívoco na interpretação desses depoimentos e dos fatos apurados não implica a sua falsidade”, assinalou. Para o relator, o ex-empregado não esclareceu de que forma foram desconsiderados fatos atestados nos depoimentos colhidos, tanto no processo administrativo quanto nos autos da ação criminal, que poderiam demonstrar a incorreção da decisão regional.
O relator observou também que a sentença proferida na esfera criminal não tratou das mesmas questões apreciadas na esfera trabalhista, relacionadas ao dever de zelo do empregado, por culpa, concorrendo indiretamente para que se consolidassem danos ao patrimônio público. A justa causa foi mantida com base no depoimento prestado pelo próprio ex-empregado durante o processo administrativo disciplinar e nas demais provas. Segundo Vieira de Mello Filho, as acusações que levaram à justa causa, no caso, não implicam conduta criminosa, “até porque os crimes pelos quais o autor foi indiciado não se tipificam pela conduta culposa, imputada na esfera trabalhista”.
Fonte: TST (Ricardo Reis e Carmem Feijó/GS)
[i]Advogado desde 1997 – OAB/SP 147.519 e OAB/RJ 213.221 – Sócio Administrador de Fernando Borges Vieira Sociedade de Advogados – Bacharel em Direito (FMU) – Especialista em Compliance (Insper) – Especialista em Liderança (FGV – GVlaw) – Especialista em Direito Processual Civil (CPPG/FMU) – Mestre em Direito (Universidade Mackenzie) – Certificado em Compliance Anticorrupção (LEC) – Personal, Professional e Lider Coach pela Sociedade Brasileira de Coaching – Professor de Pós-Graduação Direito Processual do Trabalho – Membro do Grupo de Pesquisa em Direito do Trabalho da Universidade Mackenzie – Diretor do Núcleo de Direito Processual do Trabalho da OAB/SP/ Jabaquara – Membro do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP) – Membro da Associação dos Advogados de São Paulo (AASP) – Membro da Associação Brasileira dos Advogados Trabalhistas (ABRAT) – Membro da Associação dos Advogados Trabalhistas do Estado de São Paulo (AATSP) – Associado ao Instituto Brasileiro de Compliance (IBC) – Associados ao Instituto Compliance Brasil (ICB) – Palestrante OAB/SP e Escola Paulista de Advocacia – Autor e coautor de obras e relevantes artigos jurídicos.
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